A não incidência do ITBI na Integralização de Capital na Holding (Familiar ou qualquer Pessoa Jurídica)
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- 14 de abr.
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Por Ricardo Hiroshi - 7 de abril de 2025 - Atualizado: 13 de abril de 2025

Não é de hoje que se ouve a expressão “holding familiar”, geralmente utilizada por amigos que pretendem administrar o patrimônio próprio e o de suas famílias.
De fato, a holding familiar é uma empresa que administra o patrimônio de uma família. Geralmente, essas empresas têm como objeto a administração imobiliária, sendo seu capital formado e integralizado por imóveis.
Assim, devido à legislação municipal – cuja competência é regulamentar o Imposto sobre Bens Imóveis -, há exigência desse imposto na integralização do capital social.
Por exemplo, aqui em Assis, a Lei Complementar Municipal nº 01/2010 dispõe, em seu artigo 4º, que há incidência do ITBI (2%) na integralização realizada por bens imóveis para a empresa (holding) que tiver, como atividade preponderante, a compra e venda desses bens ou direitos, ou a locação ou arrendamento mercantil.
Entretanto, a leitura atenta do artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição Federal deixa claro que a incidência ocorreria apenas nas hipóteses de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica. Senão, vejamos o que diz:
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos à sua aquisição;
§ 2º O imposto previsto no inciso II:
I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, a locação de bens imóveis ou o arrendamento mercantil.
O dispositivo acima dispõe claramente que o ITBI “não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital”. Ou seja, o citado imposto não incide na incorporação de bens ao patrimônio de pessoa jurídica como pagamento de capital subscrito.
Desse modo, a melhor interpretação do artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição Federal sustenta a imunidade do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) na transferência de imóveis em integralização de capital, ainda que a atividade preponderante da empresa esteja relacionada à administração de imóveis.
Isso porque a Constituição Federal estabelece uma imunidade incondicionada ao fixar a não incidência do ITBI sobre a transferência de imóveis em integralização de capital, excetuando – tão somente – a transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica que desenvolva atividades preponderantemente imobiliárias.
O dispositivo constitucional em análise prevê uma exceção à imunidade ao estabelecer que haverá não incidência, “salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, a locação de bens imóveis ou o arrendamento mercantil”. Em outras palavras, a expressão “salvo se, nesses casos” refere-se aos casos de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica.
A respeito disso, o Ministro Alexandre de Moraes, em seu voto proferido no RE 796.376/SC, cuja tese foi firmada no Tema 796, esclareceu, sem margem para dúvidas, o conteúdo daquela expressão, nos seguintes termos:
“Em outras palavras, a segunda oração contida no inciso I – “nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, a locação de bens imóveis ou o arrendamento mercantil” – revela uma imunidade condicionada à não exploração, pela adquirente, de forma preponderante, da atividade de compra e venda de imóveis, de locação de imóveis ou de arrendamento mercantil. Isso fica muito claro ao observarmos que a expressão “nesses casos” não alcança o “outro caso” referido na primeira oração do inciso I, do § 2º, do art. 156 da CF.
Ou seja, a exceção prevista na parte final do inciso I, do § 2º, do art. 156 da CF/88 nada tem a ver com a imunidade referida na primeira parte desse inciso.
Reitere-se que as hipóteses excepcionais ali inscritas não aludem à imunidade prevista na primeira parte do dispositivo, a qual é incondicionada, desde que se refira, evidentemente, à conferência de bens para integralizar o capital subscrito.” (g.n.)
Assim, mesmo que a atividade preponderante da empresa (holding) compreenda a compra, venda, locação, incorporação e construção de imóveis próprios, a imunidade deve afastar a incidência do ITBI.
Escrevendo sobre o tema, Kiyoshi Harada afirma:
(…) Tratando-se de transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, a imunidade é incondicional, não fazendo sentido a verificação das condições previstas na parte final do inciso I do § 2º do art. 156 da CF. Superadas as divergências doutrinárias e jurisprudenciais, na sessão virtual do dia 5/8/2020 o STF, por maioria de votos, ao resolver o Tema nº 796 da repercussão geral e ao interpretar o inciso I do § 2º do art. 156 da CF, firmou a tese de que o valor excedente do bem incorporado à pessoa jurídica, na operação de integralização do capital subscrito, sujeita-se à tributação do ITBI, bem como que as restrições à imunidade referem-se apenas aos casos de incorporação, fusão, cisão ou extinção de pessoa jurídica.
No que tange à interpretação da imunidade prevista no artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição Federal, Guilherme Traple explica:
“… o vocábulo “nem” divide o dispositivo legal, criando situações distintas.
…
Assim, o ITBI não incide: (a) sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital; e (b) sobre a transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nos casos de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, a locação de bens imóveis ou o arrendamento mercantil.
Portanto, pela mais simples leitura do inciso I do § 2º do artigo 156 da CRFB/1988, pode-se concluir que a transmissão de bens ou direitos reais sobre bens imóveis à pessoa jurídica, em realização de capital, é absolutamente imune à cobrança do ITBI, não havendo qualquer exceção.”
Assim, no caso de transferência de imóvel em realização de capital – conforme a primeira parte do inciso I do § 2º do artigo 156 da CF – não cabe cogitar a incidência do ITBI, mesmo que essa operação seja realizada por pessoa jurídica que desenvolva atividades preponderantemente imobiliárias.
Isso porque a espécie de imunidade tributária em questão é incondicionada, ou seja, independe das atividades desenvolvidas pela empresa. Em outras palavras, a limitação ao poder de tributar protege as transferências de imóveis destinados ao capital social de pessoa jurídica que se dedique à consecução de qualquer tipo de objetivo social.
Então, a simples leitura do dispositivo constitucional acima leva a conclusão de que a transmissão de bens à pessoa jurídica (empresa) em realização de capital é absolutamente imune à cobrança do ITBI, de modo que qualquer lei complementar municipal que assim o exija, não pode ter eficácia, porque inconstitucional.
Essa questão chegou ao Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a sua repercussão geral no Recurso Extraordinário nº 1.495.108, e espera-se uma decisão favorável ao contribuinte.
Mas, independentemente disso, em razão da técnica de modulação dos efeitos da sentença que está sendo aplicada em casos como este, recomenda-se que todo aquele que tenha recolhido o ITBI nos últimos 5 (cinco) anos ou que for integralizar capital social de empresa com bens imóveis, procure um advogado tributarista para a devida análise, seja para solicitar a devolução do que pagou, seja para deixar de recolher o imposto.
Autor:
Ricardo Hiroshi Botelho Yoshino (Advogado)
Fonte:
Assiscity (https://www.assiscity.com/a-nao-incidencia-do-itbi-na-integralizacao-de-capital-na-holding-familiar-ou-qualquer-pessoa-juridica/)
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